“Bioma-coração”, o Cerrado, localizado na parte central do Brasil, tem mais do que uma posição geográfica estratégica: é primordial no bombeio e distribuição de água que dá vida às principais bacias hidrográficas nacionais e sul-americanas. Esse berço de nascentes oferece recurso hídrico para ao menos 25 milhões de pessoas que vivem na região e outros muitos milhões que são atendidos subsidiariamente. Mas o recorrente aumento do desmatamento — que elevou o ecossistema nos últimos anos aos piores percentuais de conversão da vegetação nativa para outros fins, com perda média de 10 mil quilômetros quadrados anuais — coloca todo esse potencial hídrico em rota de crise.
Artigo de pesquisa publicado na Global Change Biology, que quantificou os impactos das extensas transições de uso de solo sobre a evapotranspiração e a temperatura da superfície terrestre, aponta que o Cerrado já está 10% mais seco e 1º C mais quente, na comparação com a linha de base histórica de vegetação nativa.
Dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) demonstram que dos dois milhões de quilômetros quadrados que congregam o bioma, quase 51% já foram convertidos. Enquanto em fevereiro de 2024 houve redução de quase 30% no desmatamento da Amazônia, na comparação com o mesmo período de 2023, no Cerrado houve aumento de 18,5%, o que é bastante preocupante, segundo o coordenador do Programa de Monitoramento da Amazônia e demais Biomas do Inpe, Claudio Almeida.
— Isso mostra que a gente tem muito para avançar, tem muito que conseguir melhorar essa questão do controle de desmatamento na área do Cerrado — afirma o coordenador do Inpe.
Esse ecossistema, que domina quase um quarto do território nacional, tem apenas 20% de sua área legalmente protegida, percentual muito inferior ao da Amazônia, por exemplo, onde em 50% da área não se pode mexer. E ao devastar a vegetação nativa, não há como dissociar os efeitos consequentes nas fontes hídricas.
— Alguns pesquisadores mostram que já existe uma redução no volume de água dos rios que saem do Cerrado. Esses rios estão diminuindo sua capacidade por conta do desmatamento. Então você começa a impactar seriamente a produção de água, impactar a agricultura, a pecuária, o abastecimento humano, geração de energia. Tudo isso depende dessa água que vem do Cerrado — expõe o coordenador do Inpe.
Com pequenas porções no leste da Bolívia e nordeste do Paraguai, no Brasil o bioma esparrama-se no Planalto central e consegue congregar estados de todas as regiões: Centro-Oeste (DF, GO, MT e MS), Norte (TO, RO, PA, e enclaves do AM, RR e AM), Nordeste (BA, CE, MA e PI), Sudeste (SP e MG) e no Sul (PR).
O Cerrado, que tem sua data comemorativa em 11 de setembro, encerra a série Biomas, publicada pela Agência Senado nos últimos seis meses para dar voz à biodiversidade, apontar os problemas e expor o debate legislativo sobre cada ecossistema.
Fonte: Agência Senado